O MINEIRO E O QUEIJO

Cartaz do filme O MINEIRO E O QUEIJO

Opinião

Cresci vendo fazer queijo de minas e nunca me perguntei qual seria a sua origem. Faz sentido. No século 18, quando os portugueses desbravaram o que hoje é Minas Gerais atrás de ouro, levaram junto a tradição europeia de fazer o queijo de forma artesanal. Aventureiros atrás de riquezas nas regiões das minas, os portugueses encontraram no queijo uma maneira de conservar o leite e seu valor nutritivo. Foi nas regiões de serra, onde o clima se assemelha mais ao europeu, que encontraram o ambiente propício para desenvolver o que se tornaria décadas mais tarde parte da cultura brasileira e patrimônio nacional.

Interessante, não? Mais interessante ainda é o documentário em si. Helvécio Ratton (também em Batismo de Sangue) mostra basicamente dois ângulos da questão. De um lado, e de longe o mais gracioso e divertido, estão os produtores de queijo – hoje são quase 30 mil famílias que vivem dessa produção artesanal. Quem tem um pouco de vivência da roça, vai se deliciar com as imagens dos ranchos, das cozinhas de fogão à lenha, das mãos apertando o queijo para tirar o soro. Quem tem tudo isso e ainda é mineiro, vai adorar os depoimentos honestos, simples, autênticos dos simples produtores artesanais – sem falar do delicioso sotaque! Esta parte chega a ser poética, na simples condição de as famílias serem as facilitadoras de toda a cadeia de produção, aqueles que fazem o queijo como faziam seus pais, avós, bisavós. É tradição pura.

Digo pura porque de lucrativa ela não tem nada – só tem lucro quem lida com a questão de maneira industrial, em grande escala. E aqui está o outro lado do jogo. A legislação brasileira consegue emperrar até a comercialização legal de um simples, tradicional e delicioso queijo de leite cru (seja ele curado ou frescal). Parece mentira, mas o documentário mostra que por causa de uma divergência entre as leis estadual e federal, não se tem um consenso sobre o tempo de maturação do queijo. Portanto, ele é proibido de ser vendido fora do estado  de Minas. Assim como muitos outros produtos lícitos (e ilícitos), o queijo torna-se viável enquanto produção somente se encontrar brechas para ser despachado para o Brasil e o mundo. Dito e feito: o queijo tomado como patrimônio nacional tem entraves na justiça, mas absoluta aceitação nas mesas brasileiras. Falta bom senso e vontade política até nisso.

Ratton não só acerta o tom, ao mesmo tempo natural e questionador, mas mostra o processo de produção, o comprometimento das famílias produtoras, das cooperativas, o trabalho em equipe para viabilizar a produção, as exigências dos órgãos de vigilância sanitária, as diferenças de paladar, o cuidado e envolvimento emocional dos produtores, a delícia do produto final. Poucas coisas são mais gostosas do que um pão recém assado no fogão a lenha, com queijo de minas e um cafezinho. Ainda sou capaz de sentir aquele aroma…

Trailers

Comentários